Autogestão, Disciplina no Trabalho e o Direito à Preguiça
Quando os trabalhadores tornam-se os proprietários dos meios de produção, qual o sentido do trabalho? Que tipo de disciplina é necessário para a construção de relações econômico-sociais que possam, de alguma maneira, contrariar a lógica do capital? Na prática, como os trabalhadores associados concebem o que denominam autogestão? Reproduzir depoimentos e, em especial, alguma “queixas” dos trabalhadores associados ajuda-nos a trazer à tona os impasses vividos no interior das fábricas que, a partir da década de 1980, vêm sendo ocupadas e/ou apropriadas por ex-funcionários. Nesse horizonte, o objetivo deste artigo é, a partir das contribuições do materialismo histórico, refletir sobre o árduo processo de criar e recriar uma nova disciplina no trabalho – conceito este a ser apreendido na sua historicidade. Sinalizamos que, sendo as experiências dos trabalhadores tecidas no interior da sociedade capitalista, a conquista do direito à propriedade (agora não mais individual, mas coletiva) pode trazer embutido o “direito à preguiça” e, mesmo, o direito ao não-trabalho como direitos inerentes à propriedade individual dos meios de produção. Dialogando com Paul Lafargue sobre a dicotomia trabalho-ócio imposta pelo capital e partindo do pressuposto gramsciano de que disciplinar-se é tornar-se independente e livre, enfatizamos que a produção associada representa a possibilidade de os trabalhadores recriarem o trabalho; no entanto, é preciso compreender os limites da gestão operária, tendo em conta as condições objetivas e subjetivas da sociedade de classes.